Desmistificando a Gordura Animal. Porque deveríamos incorporá-la em nossa dieta diária (numa quantidade muito maior do que imaginamos!)

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A alimentação é um dos pilares fundamentais da saúde humana, mas, nas últimas décadas, tornou-se um campo minado de desinformação, interesses comerciais e dogmas científicos questionáveis. Um dos temas mais controversos é o real papel da gordura saturada animal na dieta moderna atual. Enquanto muitos ainda a veem como um vilão, pesquisadores como Weston Price, Tim Noakes e Mary Ruddick têm desafiado essa narrativa, mostrando que a gordura animal pode ser essencial para uma saúde duradoura. Por outro lado, a gordura vegetal hidrogenada, amplamente promovida como uma alternativa “saudável”, tem se mostrado um dos maiores erros da nutrição moderna. Este post busca desmistificar esses conceitos, explorando a história, a ciência e os impactos metabólicos desses dois tipos de gordura.

Weston Price: A Busca pelas Origens da Alimentação Ancestral

Weston A. Price, um dentista e pesquisador norte-americano, foi um dos primeiros a questionar as mudanças na dieta moderna. Na década de 1930, ele viajou pelo mundo estudando populações indígenas que ainda mantinham dietas tradicionais. Seu trabalho, documentado no livro Nutrition and Physical Degeneration, revelou que essas populações, que consumiam dietas ricas em gorduras animais, tinham dentes fortes, ossos robustos e quase nenhuma incidência de doenças crônicas.

Price observou que, quando essas populações adotavam dietas ocidentais modernas, ricas em açúcares refinados e gorduras processadas, rapidamente desenvolviam cáries, deformidades faciais e doenças degenerativas. Ele concluiu que as gorduras animais, especialmente as provenientes de animais criados em pastagens, eram essenciais para a saúde humana, fornecendo vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) e ácidos graxos essenciais.

Apesar de suas descobertas revolucionárias, o trabalho de Price foi amplamente ignorado pela comunidade científica convencional, que na época começava a abraçar a ideia de que as gorduras saturadas eram prejudiciais.

Tim Noakes: O Preço de Desafiar a Indústria Alimentícia

Tim Noakes, um renomado cientista esportivo sul-africano, é outro defensor da gordura animal. Inicialmente, Noakes promovia dietas ricas em carboidratos para atletas, mas após revisar a literatura científica e experimentar em sí mesmo, ele mudou radicalmente sua posição. Deste modo, ele passou a defender uma dieta rica em gorduras animais e pobre em carboidratos, conhecida como dieta cetogênica.

Noakes foi alvo de intensa crítica e perseguição por parte da indústria alimentícia e da mídia. Em 2014, ele foi levado ao conselho de saúde da África do Sul por “promover uma dieta não comprovada” após recomendar que uma mãe amamentando seguisse uma dieta rica em gordura. Neste contexto, o caso levado aos tribunais durou anos e custou a Noakes uma fortuna em honorários advocatícios, mas ele acabou sendo absolvido de todas as acusações.

A história de Noakes ilustra como a indústria alimentícia e os interesses comerciais podem influenciar a ciência e a opinião pública. A gordura animal, especialmente a saturada, foi demonizada não por evidências científicas sólidas, mas por uma campanha bem-orquestrada que beneficiava a venda de produtos processados e gorduras vegetais.

Mary Ruddick: O Microbioma e a Dieta Ancestral na Modernidade

Mais recentemente, a pesquisadora Mary Ruddick tem explorado a conexão entre a dieta ancestral, o microbioma intestinal e a saúde moderna. Seu trabalho sugere que a gordura animal desempenha um papel crucial na manutenção de um microbioma saudável, que por sua vez regula a inflamação, a imunidade e o metabolismo.

Mary é uma grande desbravadora da cultura de povos isolados pelo globo terrestre. Suas viagens, pesquisas e relatos destas tribos apartadas de qualquer tipo de contato e influência pela a civilização moderna são impressionantes. Baseada em muitas dessas viagens e estudos, Ruddick argumenta que a dieta moderna, rica em gorduras vegetais processadas e carboidratos refinados, altera negativamente o microbioma, levando a disbiose (desequilíbrio microbiano) e a uma série de doenças crônicas. Neste sentido,ela defende o retorno a uma dieta rica em gorduras animais e alimentos fermentados, que promovem a diversidade e a saúde do microbioma.

A Ascensão da Gordura Vegetal Hidrogenada: Um Erro Histórico

Enquanto a gordura animal era demonizada, a gordura vegetal hidrogenada era promovida como uma alternativa “saudável”. Esse processo começou no início do século XX, quando empresas como Procter & Gamble desenvolveram a margarina, um substituto barato para a manteiga. Através da hidrogenação, um processo químico que transforma óleos vegetais líquidos em gorduras sólidas, as indústrias conseguiram a abertura que precisavam, permitindo a criação de produtos com maior prazo de validade e menor custo.

Empresários como William Procter e James Gamble viram na hidrogenação uma oportunidade de lucro. Eles investiram pesado em marketing, promovendo a margarina como uma opção mais saudável e moderna. Desta maneira a indústria de óleos vegetais cresceu rapidamente, apoiada por subsídios governamentais e campanhas publicitárias que associavam gorduras animais a doenças cardíacas.

No entanto, a gordura vegetal hidrogenada é rica em ácidos graxos trans, que são extremamente prejudiciais à saúde. Estudos mostram que os ácidos graxos trans aumentam o colesterol LDL (o “mau” colesterol), reduzem o HDL (o “bom” colesterol) e promovem inflamação, resistência à insulina e doenças cardiovasculares.

O Processo Metabólico: Gordura Animal vs. Gordura Vegetal Hidrogenada

Para entender os impactos dessas gorduras na saúde, é essencial comparar seus efeitos metabólicos.

Gordura Animal (Saturada)
  • Composição: Rica em ácidos graxos saturados e colesterol.
  • Metabolismo: As gorduras saturadas são estáveis e menos propensas à oxidação. Elas são usadas pelo corpo para produção de energia, síntese hormonal e manutenção das membranas celulares.
  • Benefícios: Promove saciedade, regula os níveis de açúcar no sangue e fornece nutrientes essenciais como vitaminas A, D, E e K.

Gordura Vegetal Hidrogenada
  • Composição: Rica em ácidos graxos trans e gorduras poliinsaturadas oxidadas.
  • Metabolismo: Os ácidos graxos trans interferem na função celular, promovem inflamação e aumentam o risco de doenças crônicas. As gorduras poliinsaturadas oxidadas são altamente inflamatórias.
  • Desvantagens: Aumenta o risco de doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade e distúrbios metabólicos.

Os Malefícios da Gordura Vegetal Hidrogenada
  1. Doenças Cardiovasculares: Os ácidos graxos trans aumentam o LDL e reduzem o HDL, promovendo a formação de placas arteriais.
  2. Inflamação Crônica: As gorduras hidrogenadas ativam vias inflamatórias, contribuindo para doenças autoimunes e degenerativas.
  3. Resistência à Insulina: Interfere na sinalização da insulina, aumentando o risco de diabetes tipo 2.
  4. Obesidade: Promove o acúmulo de gordura visceral, associada a distúrbios metabólicos.
  5. Danos ao Microbioma: Altera a composição da microbiota intestinal, prejudicando a saúde digestiva e imunológica.

  1. Iluminação: Antes da eletricidade, a gordura animal (especialmente o sebo) era amplamente usada para fazer velas. O sebo, derivado de gordura bovina ou ovina, era derretido e moldado em velas, que eram uma das principais fontes de iluminação doméstica.
  2. Sabão e produtos de limpeza: A gordura animal foi um ingrediente essencial na fabricação de sabão por séculos. A reação química entre a gordura e substâncias alcalinas (como a soda cáustica) produzia sabão, que era usado para lavar roupas, utensílios e até para higiene pessoal.
  3. Cosméticos e produtos de beleza: A gordura animal já foi usada na produção de pomadas, cremes e outros produtos cosméticos. Sua propriedade emoliente ajudava a hidratar a pele.
  4. Combustível: Em algumas sociedades antigas, a gordura animal era queimada como combustível para aquecimento ou cocção de alimentos.
  5. Produção de couro: A gordura animal era usada no processo de curtimento de couro para torná-lo mais flexível e durável.
  6. Arte e escultura: Em algumas culturas, a gordura animal era usada como material para esculturas ou como ingrediente em tintas e vernizes.
  7. Rituais e cerimônias: Em certas sociedades, a gordura animal tinha significado simbólico e era usada em rituais religiosos ou cerimônias tradicionais.

Repensando a Nutrição Moderna/Atual

A demonização da gordura saturada animal e a promoção da gordura vegetal hidrogenada são exemplos clássicos de como a desinformação e os interesses comerciais podem distorcer a ciência da nutrição. Pesquisadores como Weston Price, Tim Noakes e Mary Ruddick nos lembram da importância de retornar às dietas ancestrais, ricas em gorduras animais de qualidade e pobres em alimentos processados.

A gordura vegetal hidrogenada, por outro lado, é um produto da industrialização e do lucro, com consequências devastadoras para a saúde humana. Para recuperar nossa saúde, precisamos rejeitar os dogmas nutricionais do passado e abraçar uma abordagem baseada em evidências, que valorize os alimentos naturais e integrais.

Como sugere o artigo The Questionable Benefits of Exchanging Saturated Fat with Polyunsaturated Fat (disponível em: amjmed.com/article/S0002-9343(14)00354-4/pdf), a substituição de gorduras saturadas por gorduras poliinsaturadas não trouxe os benefícios prometidos e pode ter causado mais mal do que bem. É hora de repensar nossas escolhas alimentares e priorizar a saúde sobre o lucro.

A verdade sobre a gordura saturada animal está finalmente emergindo, e ela pode ser a chave para uma sociedade mais saudável e informada.

REFERÊNCIAS
  1. Price, Weston A.
    • Nutrition and Physical Degeneration. 1939.
    • Livro clássico que documenta as pesquisas de Weston Price sobre dietas tradicionais e sua relação com a saúde.
  2. Noakes, Tim
    • The Real Meal Revolution. 2013.
    • Livro que explora a dieta rica em gorduras e pobre em carboidratos, defendida por Tim Noakes.
    • Para mais informações sobre o caso judicial de Noakes, consulte: Noakes Trial.
  3. Ruddick, Mary
    • Trabalhos sobre microbioma e dieta ancestral.
    • Para mais informações, visite seu site oficial: maryruddick.com
  4. Procter & Gamble e a História da Margarina
    • Para uma análise histórica do desenvolvimento da margarina e da gordura vegetal hidrogenada, consulte:
      • The Rise and Fall of Trans Fats (Harvard School of Public Health).
        Disponível em: hsph.harvard.edu/nutritionsource/transfats/
  5. Artigo Científico sobre Gorduras Saturadas e Poliinsaturadas
    • DiNicolantonio, J. J., & O’Keefe, J. H. (2014). The Questionable Benefits of Exchanging Saturated Fat with Polyunsaturated Fat.
    • Disponível em: amjmed.com/article/S0002-9343(14)00354-4/pdf
  6. Impactos dos Ácidos Graxos Trans na Saúde
    • Mozaffarian, D., et al. (2006). Trans Fatty Acids and Cardiovascular Disease. New England Journal of Medicine.
    • Disponível em: nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMra054035
  7. Microbioma e Dieta Ancestral
    • Sonnenburg, J. L., & Sonnenburg, E. D. (2019). The Ancestral Diet and the Modern Microbiome. Cell.
    • Disponível em: cell.com/cell/fulltext/S0092-8674(19)31102-1
  8. Efeitos Metabólicos das Gorduras Saturadas e Trans
    • Astrup, A., et al. (2020). Saturated Fats and Health: A Reassessment and Proposal for Food-Based Recommendations. Journal of the American College of Cardiology.
    • Disponível em: jacc.org/doi/10.1016/j.jacc.2020.05.077
  9. História da Indústria de Óleos Vegetais
    • The Oil Industry and the Rise of Processed Foods. Food and Agriculture Organization (FAO).
    • Disponível em: fao.org/3/y5022e/y5022e04.htm
  10. Impactos da Gordura Vegetal Hidrogenada na Saúde
    • Micha, R., & Mozaffarian, D. (2009). Trans Fatty Acids: Effects on Metabolic Syndrome, Heart Disease, and Diabetes. Nature Reviews Endocrinology.
    • Disponível em: nature.com/articles/nrendo.2009.37